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Contos-->Profundo Amor -- 04/04/2000 - 20:20 (Vânia Moreira Diniz) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
vaniamdiniz@zaz.com.br

PROFUNDO AMOR

Roberta da janela de seu quarto divisava o mar em sua imensa majestade, senhor absoluto de qualquer paisagem. Isso lhe dava uma certa paz interior. Acostumara-se a sentir no balanço impressionante das ondas uma maneira de acalmar-se. E a reação costumava ser instantânea. Hoje, entretanto uma tensão muito grande a dominava e ela se perguntava até quando carregaria a mágoa que lhe invadia.
Quando cheguei sorriu docemente e os bonitos olhos escuros e deslumbrantes suavizaram-se ligeiramente. Olhou-me perguntando o motivo pelo qual lhe telefonara pedindo aquela entrevista.
- Roberta sei que ainda se recupera mas há muito tempo pediu-me para escrever a sua história e acho que deve ser interessante.Pelo menos tenho conhecimento de que já sofreu um bocado. Somos amigas, há muito tempo, lembra-se?
- É claro, Regina. E por isso mesmo a escolhi. Quero, embora ainda jovem deixar um exemplo para que as pessoas possam discernir quando tiverem que decidir alguma coisa. Você escreve bem e saberá interpretar o que quero dizer
- Terá muito tempo para isso, porém acho que deve contá-la agora quando ainda tudo está tão recente. Espero poder corresponder à sua confiança. Acostumei-me a vê-la sempre tão compreensiva em tudo que estranho um pouco a sua dor presente.
Roberta segurou minhas mãos com carinho olhando-me com suavidade enquanto comentava que nossa amizade tinha lhe ajudado demasiado desde os tempos de colégio. E eu queria dizer-lhe o quanto a admirava desde aquela época pelo domínio de si mesma, discernimento e generosidade. Mas ela pareceu-me ligeiramente pensativa e deixei que ela administrasse esses momentos à sua maneira.
Dominando-se, como sempre costumava acontecer pareceu disposta a continuar nosso diálogo. Perguntei-lhe então quando desejava começar a narrativa e marcamos para o dia seguinte à mesma hora
Quando entrei Roberta já estava na pequena saleta em que iríamos trabalhar. Pedi-lhe que embora conhecendo uma parte de sua vida gostaria que ela descrevesse tudo. Era a forma mais eficaz de compor o livro.Ela concordou.
Muito bonita, os olhos escuros ligeiramente sombreados por tristeza evidente, os lábios bem feitos contornados por um batom claro, os cabelos presos, deixando à mostra o gracioso perfil que há tantos anos admirava, começou sua história com a voz harmoniosa e muita característica.
- Minha infância foi normal. Meus pais podiam como você sabe dar-me uma vida confortável e ao lado disso foi cercada de carinho. Mas o tema principal foi quando conheci Márcio. Ficamos amigos e eu confiava plenamente nele. Sempre foi uma pessoa maravilhosa. Para mim ele era o irmão que eu não tinha. Não tinha percebido que aquelas demonstrações todas eram de amor. E em algum tempo confessou-me que me amava. Disse-lhe a verdade, que não o queria dessa forma, mas gostaria que tudo continuasse com esse carinho bonito que existia entre nós. Percebi que ele ficou triste, mas com sua dedicação natural concordou. Jamais me molestaria se eu não quisesse.Todos entre família e amigos torciam por ele. Com o passar do tempo fui conhecendo outras pessoas e aos dezessete anos apaixonei-me perdidamente. Não foi uma paixão comum, Regina. Eu amei Nelson desesperadamente. Só pensava nele e minha vida passou a se centralizar em sua pessoa.
- Casou-se com ele muito cedo, não é verdade?
Roberta fez uma ligeira pausa e ambas nos recompomos.Estávamos emocionadas e ela compreendeu isso.
- Nunca pensei, Regina o que passaria de bom ou de ruim na companhia de Nelson. Amava-o e a única coisa que queria era ficar a seu lado. Ele parecia muito apaixonado por mim e sabia, sempre soube conquistar as pessoas, independente de sexo ou crença. Fazia todas as minhas vontades. Já tinha se formado em direito e tinha um emprego razoável, por isso resolvemos nossa vida. Eu continuaria estudando e trabalhando com papai.
- Sim, eu me lembro. Você foi a noiva mais bonita que jamais vi.
- Não minha amiga, não era. Apenas seus olhos afetuosos e a minha felicidade contribuíram para a sua galante visão. Quando estamos felizes parece que ficamos mais bonitas. Mas vamos continuar. Casamos e tudo parecia extraordinário. Comecei a esperar Carolina e ela foi uma suave luz na minha vida. Nelson era um marido atencioso, gentil e apaixonado. Formei-me e não quis trabalhar no seu escritório. Queria construir profissionalmente algo meu e ele não discordou.
- Você via sempre seu amigo Márcio?
- Sim, com certa regularidade, já que ele freqüentava a casa de meus pais.
Nunca o vi com nenhuma namorada e lamentava. Gostaria que ele tivesse construído sua própria vida. Iniciasse seu caminho. Em momento nenhum tentou qualquer coisa depois que eu conheci Nelson. Minha mãe costumava dizer que ele jamais me esqueceria e isso me entristecia muito. Ela dizia até que discretamente procurava saber sempre como eu estava. E se era feliz.
- E você era?
-Claro. Muito. Muito feliz. Regina. Você sabe disso.
- E quanto tempo depois tudo aconteceu?
- Doze anos. Essa parte começa a ser muito dolorosa para mim, espero que compreenda minhas emoções passageiras.
Toquei nos cabelos da minha amiga com doçura, aquiescendo com um sorriso.
- Não se apresse. Se precisar parar em algum momento assim será feito. Antes de tudo sou sua amiga, não esqueça disso.
- Eu sei. Vamos então continuar. Um dia, Regina, não amanheci muito bem. Sentia dores pelo corpo e também de cabeça. Não fui logo ao médico,entretanto comecei a reparar que meus olhos estavam inchados. Nelson ficou apavorado e fomos ao consultório do Dr.Alex. Este não me pareceu preocupado. Disse-nos que provavelmente um rim deveria estar com uma sobrecarga e lembrou-me que há muitos anos havia tido uma nefrite aguda. Pediu-me vários exames necessários.
Roberta fez uma pausa. Seus olhos estavam rasos de lágrimas e os belos traços conturbados pela recordação. Abracei-a em silêncio deixando que ela se restabelecesse porque eu mesma estava comovida. Olhou-me, então e fez um sinal que ia continuar a seu relato:
- Tinha acabado de chegar em casa quando Dr. Alex me telefonou, pedindo que eu fosse até seu consultório para conversarmos. Ele me conhecia desde criança, portanto tinha abertura com o médico, mas não lhe perguntei se era algo grave. Fui imediatamente. Quando cheguei lá preocupei-me com a presença de Nelson e ele me contou que o médico lhe pedira a sua presença. Resumindo, minha amiga, eu estava com o meu rim paralisado. Era portadora de uma doença até certo ponto rara, precisaria de sessões de hemodiálise e absoluto repouso. Um período de internação seria necessário. E também uma consulta a um especialista, ou seja, um nefrologista. Deu-me o nome e pediu-me que fosse no dia seguinte ao médico indicado, Dr. Renato.
Fiquei meio apavorada e meu marido manteve-se o tempo todo silencioso. Pelo caminho até chegar em casa ele dizia não aceitar o que o Dr. Alex falara. O resultado de tudo foi inusitado, Regina. Comecei o tratamento, mas Nelson parecia desconhecer o que ocorria. Dizia sempre que não acreditava em nada daquilo e eu piorava muito.. Tinha muitas dores, fazia hemodiálise três vezes por semana. E inchei demasiadamente. Fiquei quase irreconhecível.
Nelson começou a se afastar, arranjava desculpas para não estar em casa nem no hospital e me parecia que ele queria fugir de todo aquele drama. Mais tarde soube que passara uma situação complicada na infância, porém nada me consolava de seu trágico abandono. Logo que Márcio soube que eu estava doente procurou-me e iniciou-se um processo complicado de troca de papéis. Nos momentos mais difíceis o meu amigo lá estava. Nelson chegou a viajar nesse período dizendo precisar de um tempo. E um dia em que estava sofrendo uma crise das mais sérias, inchada, feia e desesperada foi Márcio que esteve ao meu lado, confortando e até me atendendo em coisa íntimas com as quais fiquei envergonhada. Ele me dizia que não existia isso quando se amava a pessoa. Desconfiava que Nelson tinha outra mulher, mas só me convenci quando meu pai trouxe-me a prova que eu pedira. O que é Regina, está sentindo-se mal?
Eu me levantara pedindo dessa vez, um tempo.
- Sim, mas é passageiro. Pode continuar, Roberta
- Minha amiga, acho que não precisa de muitos detalhes. Você vai compor sua história com o resumo do que estou lhe relatando. E está chegando ao fim. Enquanto Márcio quase se mudara para casa de meus pais onde eu estava naquela fase Márcio me abandonou e confirmou sobre a amante. Deu-me a desculpa que não tinha estrutura para enfrentar tal situação. E eu mal, com minha auto-estima quase extinta só não cheguei à
depressão completa pela dedicação desse amigo que fez o papel de meu efetivo companheiro. Ele me dava amor, entende, Regina? Nesse período todo me carregava para ir ao banheiro, abraçava-me e dizia o quanto me amava. E eu me perguntava como ele poderia amar alguém naquelas circunstâncias. Mas eu sabia que amava. Não deixava que eu me sentisse frágil e feia. Eu ia morrer, minha amiga. Os médicos falaram que se meu estímulo baixasse mais, minhas defesas iriam embora com ele. E Márcio chegou a abandonar tudo para ficar a meu lado.Compreende o que era estar numa situação desesperadora, mas ter a maior prova de amor que um homem pode dar?
Roberta parou e eu segurei suas mãos com intenso carinho tentando fazer-lhe entender que eu a compreendia.
- De repente eu comecei a reagir e meu organismo também.Eu precisaria de um transplante e os médicos não entendem ainda hoje essa recuperação. Disseram que se não fossem cientificamente formados entenderiam que isso fora um milagre. A recuperação foi lenta e dolorosa. A ação dos remédios fez cair quase todo o meu cabelo e usava uma pequena boina e quantas vezes Márcio me pediu que eu a tirasse e ele mesmo o fazia sorrindo e passando a mão carinhosamente em minha cabeça. Foi muito difícil a convalescença, todavia tenho certeza, Regina que só o consegui por causa de Márcio. Ele fazia coisas incríveis. Flores, jantares encomendados que me trazia na cama, presentes e muito, muito amor.
- E Nelson?
- Desapareceu naquela época. Desapareceu. Ninguém o via e soube que deixou um assistente em seu escritório e viajou. Foi à Europa. Não entendo, Regina. Não entendo as atitudes de certas pessoas.
- Esqueça disso agora, Roberta. Você teve muito mais do que o lado negativo.Você teve a maior prova de amor e generosidade que alguma mulher pode ter.
Naquele momento houve uma pequena batida na porta e Roberta pediu que entrassem. Quando eu vi Márcio entrar entendi mais do que tudo como aquele homem amava a minha amiga. Seus olhos eram inundados de ternura quando a olhava e isso podia perceber-se tranqüilamente. Poucas vezes havia percebido sentimento tão evidente. Quando ela pediu um momento para concluir a conversa comigo e ele saiu, Roberta pode finalizar:
- Regina, o meu restabelecimento já se deu há bastante tempo e eu estou bem.
- E muito bonita. Linda como sempre
Ela sorriu docemente agradecendo o meu elogio e perseguiu:
- A maior prova de amor eu recebi num momento torturante. Estava inchada, deformada pela doença e infeliz.
- Isso mesmo. Deve levar isso pela vida afora como algo inesquecível Nada poderá fazê-la esquecer esse acontecimento. Mas onde está Nelson?
- Esse é o momento pior. Ele me viu há poucas semanas numa festa. No dia seguinte tentou me procurar. Finalmente achando que ele queria falar alguma coisa sobre a separação judicial resolvi atendê-lo, Regina. Sabe o que ele queria? Dizer que me amava. Chorou dizendo que fez isso tudo porque não poderia conceber e imaginar a minha morte. Deixou a amante e me persegue continuamente. E aí vem a pergunta: Sei que adoro Márcio e como poderia ser de outra forma? Mas não consigo deixar de pensar na miséria da vida de Nelson mesmo sabendo que ele é um canalha. Ajude-me Regina. Detesto-o, mas minha cabeça não me obedece.
Abracei-a perguntando-me o que diria o seu coração lamentando a involuntária e enigmática maneira de amar das pessoas e o mistério psicológico que envolve a natureza humana e desejei sinceramente que Roberta conseguisse sentir por Márcio uma paixão violenta que o compensasse de tanto amor e que fizesse a ambos felizes.
Resolvi esperar um tempo para que obtivesse uma conclusão mais evidente e então começar a minha história.
Vânia Moreira Diniz


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